Música | Galo Preto


Entre uma correria e outra do trabalho eu não podia deixar de compartilhar com vocês a experiência que vivi dia primeiro de dezembro no Teatro Santa Izabel, templo das artes cênicas e de grandes espetáculos aqui no Recife. Tomás Aquino Leão nasceu no quilombo Rainha Isabel em Bom Conselho, interior de Pernambuco. Aos oito anos de idade já arriscava algumas rimas imitando os emboladores da região, só mais tarde ganha a alcunha de Galo Preto por apartar brigas, isso lá pelos anos 1930. Hoje, aos 81 anos, titulado Patrimônio Vivo do Estado, Mestre Galo Preto lança o primeiro CD de sua carreira, mas só quem esteve lá sabe a emoção que tomou conta do lugar.

O teatro que foi construído no período do Brasil Imperial, encheu-se de mestres e mestras da cultura popular, de brincantes do coco e das sambadas que animam o Recife, as ladeiras de Olinda, as praias de Itamaracá, as ruas de Igarassu e tantos outros pólos coquistas do estado. As portas se abriram e pouco a pouco as pessoas foram tomando acento. Enquanto o funcionário recolhia os ingressos uns mais afoitos lamentavam a impossibilidade de dançar ao som do pandeiro de Galo Preto. "Infelizmente o Santa Isabel não é uma casa de shows, dançar está fora de cogitação, pode comprometer a estrutura do piso histórico do teatro" dizia um funcionário gentil.

O bater dos pés e tamancas foi substituído pelas palmas ritmadas, eram 570 almas dançando coco em segredo. Nas coxias, técnicos e artistas amigos do mestre explodiam de emoção e batiam sim as tamancas do chão de madeira, o palco é solo sagrado e as coxias são parte disso. Que alegria ver o povo negro pisando num espaço tão comum e à cultura branca e Galo Preto sabe bem disso.

"Vou entrar para história como o homem que ousou levar o coco para o Teatro Santa Isabel"


A cada toque do pandeiro, ao reconhecer a toada que viria a seguir, o teatro inteiro se enchia de gritos e respostas, a tradição oral bradava a plenos pulmões. Parabéns Mestre pela conquista, ela é de todos nós, é maravilhoso ver um edital de iniciativa privada como Itaú Cultural premiando figuras da cultura popular como Galo Preto. 

O teatro recebeu esse nome em homenagem a princesa Isabel, filha do imperador Dom Pedro II, que mais tarde ficou conhecida por ter assinado a Lei Áurea. Joaquim Nabuco adorava dizer que a causa abolicionista tinha sido alcançada neste teatro graças aos diversos discursos proferidos por ele. Na real, não há nada mais prazeroso no mundo do que ser protagonista da própria história, Galo Preto e o coco superaram todos os discursos de Joaquim Nabuco num só noite. Estamos todos de alma lavada.

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