Os contos negreiros de Freire


Lançado em 2005 Contos Negreiros de Marcelino Freire é desses para ler num gole só, como quem bebe uma dose de cachaça. E sendo eu leitora de primeira viagem dele, ardeu bastante e subiu de uma vez à cabeça. Pernambucano natural de Sertânia, Freire é um dos principais nomes da nova geração de autores no Brasil. 

A leitura exige ritmo, da mesma forma que precisamos de atenção ao conversar com um sertanejo, caso contrário perdemos o fio da meada. O conto Esquece é desses. Um desabafo para ler de uma vez só sem respirar nem pensar duas vezes nem olhar para os lados e sentir na alma a angústia de quem sabe que todo camburão tem mesmo um pouco de navio negreiro.

Histórias que parecem ter sido vomitadas na gente enquanto cuidávamos da própria vida. Feito Trabalhadores do Brasil, que vem de de testa lembrando que nada na vida é de graça e a que tipo de espaço a mais valia negra ainda está reservada. Marcelino é dono de um síntese tão poderosa que assusta. Traduz, não por acaso, a falta de voz do povo preto, que hoje luta para ocupar os espaços de fala. Alguns personagens são aquelas vítimas do sistema que a gente sabe que existe, sabe que são muitas, mas que muita gente prefere fazer de conta que nunca ouviu falar. O livro é quase um grito de socorro.

Para quem ainda não tem o hábito de ler por entretenimento Contos Negreiros é uma experiência perfeita e garantia de deixar o leitor com sede de mais palavras do autor. Não deixa ressaca, mas é de ir até o colofão por apego ao que foi lido.

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