Um mergulho no Quarto de despejo


"Todos têm um ideal. O meu é gostar de ler."
Ela encontrou nas palavras o alívio que tanto sonhava, a extinta favela do Canidé em São Paulo lhe era uma prisão sem muros e saneamento básico. Mãe de três filhos, a ex catadora de papel entra para história do conceituado universo literário brasileiro com o livro Quarto de Despejo, obra mais lida e traduzida no mundo sendo superada somente anos depois pelo imortal Paulo Coelho.

Mineira e natural de Sacramento, Carolina estudou até a a segunda série e cresceu numa comunidade onde a tradição oral era marcante. Seu primeiro contato com a literatura foi em sua terra natal, onde o oficial de justiça Manoel Nogueira tinha o hábito de ler jornais, poemas e pensamentos para os negros analfabetos. O Quarto de despejo lançou uma luz sobre a dinâmica social da população pobre que vivia na favela do ponto de vista do favelado. 

A autora foi descoberta pelo jornalista Audálio Dantas, que teve acesso aos seus inúmeros diários e enxergou ali uma oportunidade. Nos anos 1950, quando a taxa de analfabetismo superava alarmantes 50% da população brasileira segundo o IBEGE, Carolina narrava seu dia a dia com lirismo surpreendente mesmo diante da baixa escolaridade.
"As oito e meia da noite eu já estava na favela respirando o odor dos excrementos que mescla com o barro podre. Quando estou na cidade tenho a impressão que estou na sala de visita com seus lustres de cristais, seus tapetes de viludos, almofadas de sitim. E quando estou na favela tenho a impressão que sou um objeto fora de uso, digno de estar no quarto de despejo."
Sensibilidade que supera violações pesadas da norma culta da língua portuguesa, característica que enriquece ainda mais a narrativa da obra, é que ali enxergamos em detalhes a autora. A fome é personagem teimosa e irritante, assim como são sublimes os poucos momentos em que, a muito custo, ela consegue comida suficiente para ela e os filhos. 

Perseguida pelos vizinhos que se tornaram personagens de seu primeiro livro, elogiada e consagrada por grandes autores como Clarice Lispector e Manuel Bandeira, Carolina Maria de Jesus é ícone da Literatura brasileira, mesmo a contragosto do professor Ivan Proença, precisa ser celebrada, lida e relida. Salve Carolina!

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